O voto de qualidade no Carf

Artigos | 10/11/2023

Victoria Werner De Nadal, advogada e associada do IEE

Recentemente foi noticiada a derrota da Petrobras no Carf, em caso envolvendo o valor de R$ 6,5 bilhões, que restou decidido por voto de qualidade. O Carf é o órgão responsável pelos julgamentos administrativos em nível federal, formado por representantes da Fazenda Nacional e dos contribuintes.

Até 2020, em caso de empate em julgamentos era aplicada a metodologia segundo a qual o presidente da Turma, sempre um representante da Fazenda Nacional, tinha o voto de qualidade – uma espécie de voto de minerva. Ou seja, a tendência de desempate era favorável à União.

Em importante avanço, a Lei nº 13.988/2020 extinguiu o voto de qualidade, estabelecendo que, em caso de empate, resolver-se-ia favoravelmente ao contribuinte. Foi consagrado o “in dubio pro contribuinte”, e, em sua vigência, tivemos exemplos de casos em que o Carf alterou seus entendimentos.

Há pouco, contudo, o governo federal obteve a aprovação da Lei nº 14.689/2023, a qual restaurou o voto de qualidade e já está surtindo efeitos, como no caso da Petrobras. Enquanto o corte do gasto público infelizmente não é tratado como opção, o voto de qualidade foi utilizado para fazer frente ao rombo fiscal de R$ 168 bilhões, estimando-se que o mecanismo importaria na arrecadação de mais de R$ 50 bilhões.

Verifica-se, assim, um pêndulo do voto de qualidade no Carf, ora utilizado como um instrumento arrecadatório, o que é duplamente prejudicial à sociedade.

Em primeiro lugar, o voto de qualidade sempre foi alvo de críticas, entre as quais está a sua configuração apenas por ter mais peso, sem dialeticidade, bem como o fato de o empate caracterizar uma situação de dúvida que deveria ser revertida em benefício do contribuinte.

Em segundo lugar, aumenta-se a insegurança jurídica. Uma mudança legislativa em um intervalo de poucos anos, além de demonstrar desespero arrecadatório, acaba por prejudicar a previsibilidade e a calculabilidade, tão caros no Direito.

Engana-se quem acredita serem poucos os atingidos por esse cenário. O pêndulo em questão dá o recado: as escolhas políticas são realizadas visando os fins arrecadatórios, ao passo que o interesse público a ser prezado deveria condizer com a aplicação justa do sistema tributário.


Artigo publicado originalmente no Jornal do Comércio em 10/11/2023

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