Artigos | 30/10/2024
Pedro Saraiva, associado do IEE
Muito se tem falado sobre as casas de apostas online, mais conhecidas como bets, principalmente depois de levantamento feito pelo Banco Central ter indicado que, entre janeiro e agosto de 2024, elas receberam em torno de R$ 20 bilhões de aportes mensais. Todavia, a demografia de quem os fez chamou ainda mais atenção. Somente em agosto, a estimativa é de que 5 milhões de beneficiados pelo Bolsa Família tenham enviado R$ 3 bilhões a essas empresas. A média de gasto por pessoa foi de R$ 100.
Os números são claros sobre a chance de se perder dinheiro com as bets: dos 2 mil apostadores entrevistados pela Mobile Time e Opinion Box, 60% reconheceram ter resultados negativos. Já um estudo da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC) mostrou que 64% dos apostadores utilizam a renda principal para fazer apostas, deixando de comprar itens básicos para o dia a dia. O problema seria agravado se o brasileiro não tivesse alternativas rentáveis e seguras para aplicar seus recursos, o que não é verdade.
Hoje, no mercado, encontram-se títulos bancários garantidos pelo FGC pagando 15,3% ao ano. Em dez anos, essa rentabilidade multiplica o capital investido em mais de quatro vezes, mas, mesmo assim, esses investimentos tradicionais vêm perdendo espaço para as bets, principalmente entre os mais necessitados.
Muito se fala em regulação, taxação e proibição, mas, assim como vemos com bebidas, tabaco e até drogas ilegais, não é porque algo é regulado, taxado e proibido que deixa de ser consumido. A medicina cada vez mais caminha em direção à prevenção versus remediação - e nossas políticas públicas deveriam seguir o mesmo rumo.
Existe, ainda, a tendência do brasileiro de buscar retornos rápidos. Você pode até tentar atalhar o caminho para o sucesso financeiro, mas a matemática indica que isso não é sustentável nem recomendável. Similarmente, a natureza mostra que nem sempre os atalhos para o crescimento rendem os melhores frutos. Se uma muda de árvore pudesse "escolher" ficar em uma região livre de sombra, ela cresceria mais rápido, mas sua madeira seria mais arejada e macia, ideal para fungos e bactérias.
Políticas públicas voltadas para educação financeira seriam um bom caminho para prevenir a busca esperançosa - e temerária - pela sorte para melhorar de vida no país.
Artigo publicado originalmente no Jornal do Comércio em 30/10/2024