Artigos | 19/04/2023
Victoria Jardim, presidente do IEE
Clássicos são clássicos, pois são atemporais, eles tratam da essência humana,
daquilo que é inato e imutável no âmago do ser. Enquanto notícias, memes e polêmicas
“explodem” e ficam velhos do dia para a noite, os grandes clássicos da literatura se
mantêm. Os problemas da humanidade repetem-se com ares da atualidade, e a frase de
Dostoiévski torna-se facilmente aplicável ao contexto geopolítico de hoje: “Não há
assunto tão velho que não possa ser dito algo novo sobre ele”.
Os conflitos entre Rússia e Ucrânia não começaram neste ano, nem nas
manifestações ucranianas de 2014. O problema que hoje ocorre não é fruto de ações
tomadas no presente, mas já vem de, pelo menos, quase um século de tensão entre as
civilizações Ocidental e Oriental. O olhar focado, utilizado nas análises conjunturais,
deixa transparecer uma sensação de inércia cíclica – quase como um déjà-vu. Não há
nada de novo aqui.
Enquanto crises econômicas e políticas se alternam com momentos de calmaria,
a novidade se dá pela ascensão da China como protagonista e pela ameaça de um
conflito nuclear, o que torna o tabuleiro mais complexo, apesar de as jogadas serem
conhecidas. Nesse cenário, contar apenas com sanções econômicas e com a bravura dos
ucranianos para a dissolução da guerra parece o mesmo que contar com a sorte em um
jogo de estratégia. Um bom enxadrista utiliza-se de experiências anteriores para eleger a
melhor jogada, pois, em que pese a essência humana não mude, os seres humanos são
capazes de algo extraordinário – acumular conhecimento.
Esse conhecimento acumulado, dentro de um sistema institucional favorável, é o motor propulsor para o
desenvolvimento. Nações com uma base sólida de valores, que respeitam, acima de
tudo, a vida, a liberdade e a propriedade, são aquelas que notadamente avançam.
Para preservar esses avanços, talvez seja hora de relembrar que as verdades
autoevidentes que moldaram a civilização ocidental se aplicam a todos os homens,
portanto, o auxílio real aos ucranianos é necessário.
Talvez Biden devesse estudar as jogadas de Truman, para liderar uma coalizão internacional em vez de apostar em um prolongamento do embate para que Putin se canse do jogo. Pois o que está em jogo é não apenas um conflito isolado e distante, mas também a manutenção da paz e da prosperidade global.
Artigo publicado originalmente no Jornal Zero Hora no dia 11 de maio de 2022